segunda-feira, 5 de fevereiro de 2007

BOI NA SOMBRA.

BOI NA SOMBRA.

Há dias, deslocando-me em um táxi nessa nossa outrora cidade maravilhosa de São Sebastião do Rio de Janeiro, perguntei ao motorista se tudo estava bem. Nem tudo, meu chefe. Ainda não consegui colocar meu boi na sombra, respondeu-me o chamado profissional do volante. Pus-me a matutar no significado da jocosa expressão colocar meu boi na sombra

De pronto imaginei um nobre representante do gado vacum, deitado sob a sombra de frondosa árvore à beira de rio com águas límpidas, tranqüilas, com bastante relva para se alimentar. Pachorrentamente mascando e com o olhar triste perscrutando o horizonte.

O que o chofer pretendeu dizer? Referia-se àquele viver com o qual muitos sonham e poucos alcançam? Casa própria, carro na garagem, dinheiro no bolso, saúde, tempo livre para exercer as atividades que lhe dão mais prazer: ler, viajar, praticar esportes, brincar com os filhos ou os netos, namorar, enfim, vida sem preocupações de qualquer ordem. Tipo de vida que parece bom mas não o é. O indivíduo que fica à toa o dia inteiro, a ver o tempo escoar, há de sentir enorme tédio. O ser humano não foi criado para isso. O Senhor Deus ao criar o homem e apesar de instalá-lo no paraíso, deu-lhe a tarefa de cuidar e lavrar o Jardim do Éden. (Gênesis 2:15). Os irracionais, por nós classificados como seres inferiores, os insetos, os vegetais e as aves lutam pela sobrevivência. Por que aa raça humana não haveria de fazê-lo?

Essa a razão pela qual a sabedoria popular ao ensinar que a mente vazia é a oficina do diabo está plena de razão. No caso específico é um só o objetivo: engordar o animal para destiná-lo ao corte. Quanto mais gordo e mais pesado ele for, melhor preço atingirá no mercado. Mas o boi ignora que o abate é a finalidade de lhe permitirem comer, beber e desfrutar da sombra das árvores. Se soubesse, muito provavelmente não aceitaria aquele destino tão mansamente, tão dócilmente, pois o seu instinto de conservação falaria mais alto.

Nosso herói, o taxista, não o boi, claro está, com certeza não pensava nas outras atividades nas quais os bois são, ou eram utilizados, melhor dizendo. No transporte, na lavoura puxando o arado, nos moinhos de trigo movendo as moendas, no bombeamento de água. Tudo leva a crer que aquele motorista não pensava nesses aspectos da atividade pecuária. Não as deve ter vivenciado São cenas vividas na minha infância já longínqua, quase a perder de vista, algumas delas no interior de Minas, quando meu pai foi pastor em Araguari, no chamado triangulo mineiro.

A revolução industrial se iniciou com as invenções que surgiram entre os Séculos XVI e XVII, as quais multiplicaram as forças de trabalho. Em conseqüência, milhares de trabalhadores foram postos no olho da rua, lançados ao desemprego. Muitos protestos aconteceram e surgiu a primeira greve de trabalhadores com a destruição de fábricas e a quebra de maquinário. Isso é história, senhores, não estou a inventar. Hoje esse fenômeno ocorre com a informática, mas este é outro assunto.

Com o desenvolvimento da eletricidade e a invenção do motor a explosão o trabalho executado pelo boi passou a ser realizado pelas máquinas. O gado vacum deixou de ser utilizado naquelas atividades. Isso não lhe causou maiores problemas como aconteceu com o ser humano. Perdeu o emprego, não perdeu a pose.

O moço devia referir-se à futura aposentadoria, momento da vida na qual o trabalhador deve desfrutar dos frutos do labor exercido ao longo de muitos anos. Se assim for, muito longe ele está de atingir a meta, pois ainda é jovem, aparentando estar na faixa dos trinta. Um pouco mais ou um pouco menos, não importa. Essa diferença, se houver, não altera a rotação da terra.

A conversa daquele rapaz evocou-me cena vista em uma das viagens que realizei pelo interior. O veículo trafegava por zona rural, pecuária, melhor dizendo. O sol, inclemente, queimava intensamente. Nos dois lados da estrada extensas áreas se estendiam, mostrando grama seca e solo esturricado. Umas poucas e raquíticas árvores podiam ser vistas aqui e ali. Muitas cabeças de gado perambulavam. Umas a mugir, outras a pastar e algumas, ruminando, tentavam se abrigar embaixo de minúsculas árvores, cujas folhas produziam sombra que mal dava para proteger um dos animais. Água não havia nas imediações, pelo menos ao alcance de minha vista. Retrato fiel da ganância do ser humano que se auto classifica como homo sapiens. Na ânsia de ganhar dinheiro, destrói o meio ambiente. Derruba as florestas indiscriminadamente e, com isso, provoca a escassez de água nos rios, quando não os polui. Prejudica os outros seres da natureza e quando esta reage, clama ao Criador que o livre do furor dos elementos, mas não é capaz de se lembrar de que ele, homem, foi o causador da tragédia.

Ficam aí as minhas primeiras ponderações neste início de 2007. Que Deus permita a mim, a você e a todos nós um viver à sombra de Sua proteção neste e em todos os anos que Lhe aprouver nos conceder, sem prejudicarmos os outros e sem destruirmos a natureza, obra maravilhosa de Suas mãos.

Rio/RJ, 1º de janeiro de 2007.

Rui Xavier Assunção.

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